sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Em prédio com duas entradas, IPTU é cobrado pela mais cara

Imposto é calculado pela face da Paulista, mas aviso de cobrança chega a endereço da Rua São Carlos do Pinhal

Na velha e amarelada escritura de outubro de 1959, o apartamento da arquiteta Paula Gorinstein, de 27 anos, no conjunto de edifícios Pauliceia, tem como logradouro o número 360 da São Carlos do Pinhal, rua paralela à Avenida Paulista e que passa por trás do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Meio século após a construção do condomínio, um dos símbolos da arquitetura moderna, a Prefeitura de São Paulo mudou o endereço original para a segunda entrada do conjunto. Desde o fim do ano passado, Paula mora oficialmente no número 960 da Paulista. Segundo o governo, um longo estudo jurídico resultou na unificação do endereço pela entrada da via mais movimentada da cidade - e com mais alto IPTU.

A alteração não faria tanta diferença para a arquiteta e outros 320 moradores caso não viesse acompanhada de um aumento de 79% no Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU), de R$ 1.400 para R$ 2.500 anuais. O valor do tributo no prédio pode aumentar ainda mais a partir desta semana, com a notificação do IPTU corrigido pela nova Planta Genérica de Valores Imobiliários (PGV) - o estudo do governo, aprovado pela Câmara Municipal em dezembro, apontou a Paulista como o metro quadrado de terreno mais caro da capital, avaliado em até R$ 9.507 no trecho entre as Ruas Bela Cintra e Joaquim Eugênio de Lima.

Antes mesmo da nova notificação ter início, a mudança de endereço ratificada em dezembro já mobilizava Paula e parte dos outros donos de apartamentos na torre sul do Pauliceia, um dos 11 condomínios residenciais localizados nos 2.700 metros da Paulista. O conjunto, projetado por Jacques Pilon e Giancarlo Gasperini, tem dois prédios separados por 30 metros: um é voltado para a Paulista; o outro, para a São Carlos do Pinhal. A entrada oficial e o acesso à garagem ficam na rua paralela ao principal centro financeiro do País. A pé, os moradores podem usar ambas as saídas.

Segundo moradores - que agora movem uma ação coletiva na Justiça para tentar reverter a alteração -, nas últimas três décadas foi sempre cobrado um IPTU maior dos proprietários de apartamentos da torre virada para a Paulista, vizinha ao prédio da TV Gazeta. Já para quem tem apartamento na São Carlos do Pinhal, com vista privilegiada de um dos pontos mais altos da cidade e sem tanto barulho, o imposto era a metade do preço.

"A Prefeitura indeferiu meu pedido de correção na mudança de endereço, dizendo que eu moro na Paulista, mas a notificação chegou para o número 360 da São Carlos do Pinhal, como chegam todas minhas contas e correspondências", reclama o arquiteto Angelo Bucci, de 46 anos, proprietário no local desde 1996. Ele admite que o lado da São Carlos do Pinhal é melhor avaliado. "É uma distorção o que o governo está fazendo (ao igualar os impostos), pois morar na Paulista, com ruído de carros o tempo inteiro, é um exercício de heroísmo. Esse morador deveria ter o tributo reduzido. Tanto que os apartamentos da torre da São Carlos do Pinhal são mais procurados e valorizados."

Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Bucci participou da revitalização do edifício a partir de 2003, com reformas na estrutura e fachada. O Pauliceia chegou a ser parcialmente demolido nos anos 1990 por causa da degradação, mas virou reduto de urbanistas. Hoje mais de 40 pessoas aguardam na fila para locação. Imóvel à venda é raridade ainda maior - há oito meses nenhuma unidade é negociada, apesar da procura diária nas corretoras da região central e dos Jardins.

A Secretaria Municipal de Finanças informou que para a cobrança do IPTU sempre será considerada a rua principal de um condomínio. Sobre o conjunto Pauliceia, o governo diz que "após longo processo para a unificação do logradouro do edifício, no qual todos os recursos legais foram utilizados e, por fim, esgotados, foi decidido que a frente principal do imóvel em questão está localizada na Avenida Paulista". A Prefeitura afirma ainda que os moradores foram notificados e a alteração tem respaldo na Lei nº 10.235, de 16 de dezembro de 1986.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Diego Zanchetta

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